terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

E agora, professor?

Ontem completei uma semana de experiência como professor. Professor de História. Fui chamado pra lecionar em uma escola particular aqui perto de minha casa. Aquelas escolas de conjunto que todo mundo conhece ou já estudou antes de ir pra selva do ensino na capital. Descobri que dar aula é um troço que cansa muito. No fim do dia me sinto como se tivesse apanhado. E pra ficar mais interessante, debutei naquelas séries que todo mundo diz que são as piores: 5ª a 8ª. Bom, claro que tem as recompensas, que obviamente, não são ligadas ao salário que recebo. É engraçado como os alunos te cumprimentam sempre e até certo ponto te respeitam. Desde excesso de energia da quinta série até a letargia da oitava. Outra coisa engraçada é a idéia de hierarquia que você tem que aprender a exercitar com eles. É engraçado estar em uma posição contrária a que sempre estive Agora tenho mais uma fonte pra nutrir esse blog e acabar com pasmaceira. Minha vida e minhas opiniões sobre as coisas não dão caldo pra segurar um blog. E já tenho algo muito inusitado pra contar. Foi na aula de terça feira na quinta série da tarde. Estava eu, dando uma aula sobre introdução a História: o que é, sua utilidade, quem faz a história, como se faz, por que se faz ,discutindo conceito de Identidade e por ai vai. Passei uma atividade na aula anterior que era: “escreva em 10 linhas a História de sua vida”. Qual era a minha intenção? Mostrar que eles também têm uma história de vida, que possuem uma identidade, que são sujeitos históricos e que seus escritos podem um dia ser fonte para um historiador e por ai vai. Pedi pra que dois deles lessem o que escreveram e comparei a história de cada um. Tudo lindo e maravilhoso e eu pensando: “cara, levo jeito pra isso!” O próximo passo do meu êxtase pedagógico foi o de pedir para que eles trocassem s cadernos e lessem a história de vida do colega e como ele se definia, para que eles se conhecessem melhor. Lindo, né?Mas eu esbarrei no fator: “isso aqui não é um filme”. Um dos garotos insistia veementemente em não trocar o caderno. Insisti pra que ele o fizesse e comecei a desconfiar que ele não tivesse feito a tarefa. Pensei: “Danado! Mal comecei e já quer me tapear” Pedi o caderno dele pra se ver se tinha feito a tarefa. Ele ainda relutou mas me deu o caderno. Peguei. Abri. Bati os olhos no texto e li: meus pais são separados. “Meu pai vive com outra mulher. Minha mãe disse que isso é safadeza. Nós não gostamos disso...”
Fiquei sem ação. Parei, pensei e fiz aquela cara de neutralidade e postura pedagógica, que também pode ser conhecida por alguns como “cara de bunda”. Fechei o caderno do garoto e deixei que ele não tomasse parte na atividade. Isso mostra que a gente deve refletir muito a natureza de uma atividade desse tipo e as conseqüências para pessoas nessa idade de formação e blá blá blá ....Mas, o mais importante é comprovar que a escola não é descolada da realidade. Isso parece obvio a principio, mas só é verificável na prática. Desmancha aquela visão sobre uma infância livre de problemas. E inclusive me leva a pensar que a nossa geração inventou uma infância alçada no saudosismo dos anos 80 e nas cenas felizes cercadas por Raul Seixas no Balão Mágico com aquela cara de bêbado. O que isso mais tem feito é fazer dinheiro para produtores de festas temáticas, alimentar a carreira de bandas ruins e artistas decadentes que se escoram no mau gosto e em nossa necessidade de inventar o passado. Sinceramente, a infância é um dos lugares mais férteis para os traumas. Ser criança não é algo tão fácil quanto parece. Eu fui gordinho, tímido e grande demais pra minha idade e sei como a escola pode ser um lugar cruel. E as crianças são perversas a sua maneira. Elas aprendem e reproduzem nossos piores preconceitos. Imagino o medo desse garoto em saber que sua história de vida podia cair na boca dos colegas. Na quinta série da manhã nem inventei de fazê-los trocar os cadernos. Até porque quando peguei o caderno de um deles já li: “Minha vida é uma confusão... Brigas todos os dias...” Parei ai mesmo, já tinha aprendido a lição.

9 comentários:

tatiana hora disse...

muito legal o texto!!!

falando em anos 80, eu sou uma dessas pessoas adultas decadentes que ficam achando o máximo a minha infância a la Dominó, Cavalo de Fogo, Ursinhos Carinhosos, lambada, etc.

quanto ao guri traumatizado...

"o mundo não é um parque de diversões".

kkkkkkk

velho, ai como gosto muito mais de ser adulta!

Elaine Crespo disse...

Excelente teu texto!
Sempre fui aluna e nunca tinha analisado este lado do professor que estar ali com tanto receio quanto os alunos! Até na faculdade eu tinha um certo conceito de patamar para os professores!

Tive um problema sério com minha filha por um erro na maneira de lidar com alunos que traumatizou ela e teve que haver acompanhamento de um ano com uma psicóloga!

ela muito tímida e a professora não entendeu que este era a razão do seu afastamento dos colegas e tentou obriga la a participar a força!


Parabéns!

Um beijo
Elaine

Elaine Crespo disse...

Oi! Tem um presente pra tu no meu blog! É um mene com um selinho para premiar teu blog e para podermos saber mais sobre você!

Um beijo
Elaine

Elaine Crespo disse...

Tu é Aracaju!
Tu conheces Wesley pq vi teu comentário no blog da comunidade deles!
Wesley vem para minha casa aqui em Recife. Viaja hoje a noite e chega amanhã!:)

Você tem que fazer o que estar nas regras postado no meu blog !
Eu recebi e passei para você!O selo significa que vc ta sendo reconhecido! Mas da muito trabalho!
Ve lá como eu fiz!Ve o post no meu Blog!
Faz se quiser ..por mim esta tudo certo! Mas o selo pode colocar na pagina!(risos)


Beijos
Elaine

• newmoon ~ disse...

Nossa, que situação, hein. Quando eu era da quarta série meu professor de sociologia pediu pra gente escrever um texto sobre nossa vida, e eu como criança que era na época nao analisei a possibilidade de ele leer em voz alta, em fim, nao estava em um bom dia e escrevi tudo que vinha na cabeça, escrevi sobre eu ter ido ao psicologo algumas semanas antes e ele ter dito que eu tenho problemas sociais, enfim, meu professor leu em viz alta, e até eu terminar a oitava série ninguém falava comigo na escola. Meu professor não teve a sensibilidade que você teve, sorte para uns, azar para outros.

• newmoon ~ disse...

aah, antes que esqueça, tem uma coisa pra você no meu blog. :)

• newmoon ~ disse...

reespondendo pra tii; soomos siim duas pessoas, você ta sempre falando comigo (Mila)porque a Thais não tem muuito paciencia com essas coisas mas ela escreve posts muito bons e quiis fazer essa "parceria".

Jornalista Grace Melo disse...

Realmente a escola é um lugar cruel. E todos nós tivemos, ou fomos, 'amiguinhos' idem.

Eline disse...

Boas aulas de psicologia e sociologia fazem falta! Estudamos em Universidades...aprendendo coisas que os professores têm que ensinar...o mais complicado passa despercebido, como ensinar!
Mas, vai indo Kleber como está! Está apredendo com tuas experiencias...e isso agora é o que vai te fazer um professor de verdade!